Alan Watts foi um filósofo britânico, reconhecido por ter sido um dos primeiros a interpretar a sabedoria do Oriente, incluindo o budismo zen e o taoísmo, contribuindo para a sua divulgação no mundo ocidental. Nascido em 1915 em Chislehurst, Inglaterra, faz 50 anos, a 16 de Novembro de 1973, que morreu nos EUA.
Em 1951 mudou-se para São Francisco, onde começou a ensinar estudos budistas e, em 1956, começou o seu popular programa de rádio, “Way Beyond the West“. No início dos anos sessenta, já a viver em São Francisco, as suas palestras na rádio eram transmitidas ao nível nacional e o movimento da contracultura adoptou-o como porta-voz espiritual.
A sua abordagem única à filosofia e espiritualidade fez dele um dos pensadores mais populares e amados do seu tempo, sendo este, “O caminho do Zen”, um dos seus principais contributos.
Esta obra, agora publicado pela Albatroz (original de 1957), é uma leitura muito útil para quem está interessado em aprender sobre a filosofia do Zen e, porventura, a iniciar-se nesse caminho.
Tendo em conta que o livro foi publicado na década de 1950, poderá parecer, em alguns momentos, desatualizado. Não tanto pelo tema, ancestral, mas eventualmente pelo interesse que um leitor submerso numa vida pautada pelos valores da produtividade, o trabalho como condição humana, ou pelo flagelo do imediatismo e pragmatismo da contemporaneidade, lhe possa consignar.
Nada disto tem lugar no Tao – uma das grandes influências da prática Zen, ainda que pouco ou nada se possa afirmar sobre esta filosofia, pois
“Aqueles que sabem não falam;
Aqueles que falam não sabem” (pág. 13).
Pese embora a sua manifesta cautela, Alan Watts explora a tradição filosófica e religiosa chinesa que se concentra no entendimento e na harmonia com o Tao, ou o Caminho, com o objectivo de resgatar a sua influência na prática do Zen – uma escola de pensamento e prática budista que se desenvolveu a partir do Mahayana.
O autor inicia este ensaio histórico-filosófico descrevendo e explicando o Taoísmo e o Budismo Mahayana. Sempre com a ressalva de que
“O Tao é algo turvo e indistinto,
Tão indistinto! Tão turvo! (…)
A qualidade das fontes a que o autor recorre e o seu trabalho exaustivo sobre a filosofia e espiritualidade orientais torna esta obra especialmente valiosa. Está bem evidente, ao longo de todo o livro, que Alan Watts tem, como principal objetivo e até como missão, o desejo de que o leitor sinta curiosidade em pesquisar e colocar em prática alguns dos preceitos do Zen.
Antes disso, porém, é necessário que nós, leitores ocidentais, ultrapassemos um dos grandes obstáculos à nossa própria compreensão, nomeadamente, o pensamento dualista e a linguagem eminentemente classificatória. É neste contexto que o autor contrasta o pensamento oriental com o ocidental, salientando que o taoísmo está relacionado com a espontaneidade e o desapego, tão difícil ao conhecimento convencional do Ocidente.
Watts aborda, então, a importância do paradoxo e da não dualidade no Zen, realçando que, muitas vezes, as respostas para as questões mais profundas não podem ser explicadas verbalmente, podendo ser compreendidas somente pela experiência directa.
Isto significa que o caminho do zen não pode ser descoberto pela aquisição de conhecimento ou pelo pensamento, na medida em que é algo que está além da existência material, por isso, indizível – um dos paradoxos do Zen.
Assim, ter como objetivo o “despertar” ou ser iluminado é, paradoxalmente, deixar de tentar alcançar o Caminho – tão-somente por se ter pensado nisso de forma convencional.
Para saber o que é o Zen e, sobretudo, o que não é, a única alternativa é a sua prática, a sua experienciação.
É na parte final do livro que Alan Watts dá exemplos de práticas do Zen e de como a sua vivência e experiência directa – fundamental neste caminho – podem conduzir a uma certa ‘ideia’ de iluminação, independentemente das crenças religiosas.
O autor enfatiza, ainda, a importância da meditação como uma prática central no Zen – uma forma de acalmar a mente e alcançar uma compreensão mais profunda da realidade.
Algumas das artes descritas pelo autor, e por intermédio das quais se pode experimentar o Zen, são o haiku, a caligrafia, a jardinagem, a cerimónia do chá, a pintura e o tiro com arco.
Fica o convite.
Esta recensão foi publicada no Jornal Página1.