“Tudo o que não precisa de saber sobre a vida” – Sugestão de leitura

Tudo o que não precisa de saber sobre a vida, tendo como subtítulo “reflexões divertidas para uma vida sem preocupações” é um livro de Jerome K. Jerome (1859-1927) dedicado ao amigo e companheiro das horas de ócio: o seu cachimbo! Esta dedicatória anuncia o tom humorístico, satírico e, inevitavelmente, divertido do conjunto de ensaios que compõem esta obra original de 1886, agora publicada pela Alma dos Livros.

Com uma nota prévia no prefácio, Jerome Klapka Jerome alerta os leitores, que esperam que um livro lhes eleve o espírito, que “este livro não elevaria sequer o espírito de uma vaca”. Como tal, não o recomendaria (ao contrário de nós), dado não lhe reconhecer qualquer utilidade, a não ser a de passar algum tempo nesta leitura, depois de se ter cansado de ler “os cem melhores livros de sempre” (p. 7).

Em “Tudo o que não precisa de saber sobre a vida” o autor discorre acerca de situações da vida quotidiana de uma forma que tanto nos faz sorrir, como reflectir. Os assuntos são prosaicos, mas a vida é sublimada por isso mesmo.

A partir de temas como o ócio, o amor, a vaidade (ou a sua pretensa ausência), a timidez, o vestir e o estar, o comer e o beber, os cães e os gatos, os bebés, os apartamentos mobilados, entre outros, Jerome K. Jerome apresenta-nos, com humor, uma reflexão acutilante sobre a burguesia inglesa de finais do século XIX.

Uma das marcas da sua ironia é o, agora compreendido como, sexismo, mas que na época era generalizadamente prevalecente. Não será estranho, por isso, que algumas leitoras se possam sentir ofendidas em algumas passagens, como quando o autor se refere aos homens como os “representantes do sexo intelectual” (p. 82).

Outro tema do autor é a penúria, mostrando com leveza o poder que esta circunstância pode ter como estímulo à criatividade, não apenas na escrita, mas no modo de se observar e compreender os episódios mais ou menos imprevistos do quotidiano. A diferença entre uma pessoa que tem um ou dois pences no bolso e aquela que não tem qualquer pensamento sobre as questões monetárias, é disso exemplo.

Um guarda-chuva automático é, também ele, alvo de cogitações – o insólito é outra das características deste livro. Com o tema da memória, o autor transporta-nos para a infância, relatando as conversas que tem com o seu antecessor: o rapaz de 14 anos frívolo que foi.

Foi com esta idade que Jerome K. Jerome abandonou a escola, altura em que começou a trabalhar nos caminhos-de-ferro. Posteriormente, trabalhou como professor, actor e jornalista.

Antes deste conjunto de reflexões escreveu peças de teatro e outros livros. Este agora editado em Portugal e “Três homens num barco” têm sido continuamente traduzidos e publicados. Entre 1892 e 1897, editou a revista satírica The Idler, da qual foi um dos fundadores, e que reunia escritores da sua época, como seja Mark Twain.

Esta recensão foi publicada no Jornal Página 1.

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