No Carnaval ninguém leva a mal… ninguém levava a mal as bombas de mau-cheiro. Quer dizer, mais ou menos…
Comprávamos as bombinhas na papelaria e depois entrávamos à zurrapa nas lojas. Ou, pelo menos tentávamos.
É provável que o nosso ar reguila e os risos incontidos nos denunciassem imediatamente. O que nos ríamos. Deixávamos a bombinha e saímos a correr. Escondíamo-nos nas proximidades para vermos as reacções. E como nos ríamos, ríamos.
Era tão simples. E os adultos ficavam a ralhar durante alguns minutos e nós ríamos e ríamos.
Também comprávamos bombinhas de raspar que estalavam no interior das mãos fechadas em concha. Havia outras bombinhas que se atiravam e faziam um ruído seco que assustava quem passava.
Nessa época essas brincadeiras eram permitidas. Assim como muitas outras mais ou menos perigosas. Deviam ser. Todos os anos havia notícias de acidentes. Crianças que se queimavam. Crianças que se magoavam seriamente. Mas isso não nos demovia. Nem que tivéssemos de comprar às escondidas com as semanadas.
Não é uma apologia das bombinhas. Na verdade, nunca mais ouvi falar disso. Devem ter sido retiradas do mercado. Às tantas houve mais acidentes do que eu penso e às tantas eram realmente sérios. Não é desfaçatez.
Perdoem-me os leitores/as se, porventura, uma das crianças era familiar. Mas as brincadeiras, no Carnaval, ou outras, são uma forma de viver com mais alegria.
Viver com alegria, rindo, rindo muito, comporta riscos. Nem que seja um risco tão simples como o de se ser acusado de tolo. Talvez por isso tanta gente tenha deixado de brincar, guardando-se apenas para a época do Carnaval, quando ninguém leva mal.
Como se no resto do ano não se pudesse brincar…
Este texto foi publicado aqui, onde escrevia sem o AO de 1990.