Porto, um caso de amor

“You know I love you so” – cantavam dois dos muitos músicos que, nos dias de hoje, pintam a cidade do Porto.

Em frente ao Cubo, na Praça da Ribeira, escutava um sentimento confirmado numa versão com sotaque desconhecido de Yellow.

A expressão ‘nos dias de hoje’ não é despicienda, tão-pouco é estranho escutar sotaques e idiomas diferentes entre o número crescente de estrangeiros que a visita. 

A cidade do Porto: quem a viu, quem a ouve. Os tons musicais variam em cada esquina, ou em frente a uma casa amarela, ou vermelha ou azul, com sons e ecos diversos. O centro histórico vai-se transformando, rejuvenescendo numa paleta de azulejos multicores, procurando manter a sua marca registada nas fachadas.

É possível que a Rua das Flores seja um dos exemplos mais ilustrativos dessa renovação tão colorida e musical, quanto polémica, como se lê num protector de obra – ‘o turismo mata os bairros’. Será que quem escreveu se refere à Ourivesaria Aliança, onde a jóia é o chá, ou à mercearia das flores, onde há quem se deleite a degustar os produtos regionais, de preferência biológicos?

You know I love you so: Porto! No cais da Ribeira, local onde terminou a nossa visita, os acordes da guitarra embalavam como um barco rabelo. Se antes este tipo de embarcação trazia as pipas de vinho do Alto Douro, hoje é uma das opções para contemplar o Porto ao longo do rio. O Douro, que nessa quase noite de céu limpo, espalhava as luzes do Mosteiro da Serra do Pilar. Eram estrelas cintilantes que, na varanda do mosteiro da outra margem, convidavam à travessia da Ponte Luís I – um dos miradouros mais altos para apreciar a cidade.

Outros há, como seja o da Vitória ou o do Jardim das Virtudes. Este é, aliás, um lugar muito apreciado para tomar um copo ao fim do dia, enquanto o sol se deita… devagar. O pôr-do-sol que a câmara fotográfica de Miguel, de origem senegalesa a viver em Barcelona, gravou quando lhe perguntei qual era a sua melhor fotografia até ao momento.

Também o nosso grupo aí se detivera antes de descer as escadas da Vitória, não apenas para registar o momento para a posteridade, mas igualmente para guardar uma memória gustativa. Por sugestão de um dos elementos do grupo, deixámo-nos ficar algum tempo na Taberna Santo António, numa das esquinas do Passeio das Virtudes. Rissóis de queijo, pasteis de bacalhau e mousse de chocolate: algumas especialidades da casa que tivemos oportunidade de provar, acompanhando com o vinho da casa, como o fizeram a Rita e o Filipe.

Isso foi depois da visita ao Centro Português de Fotografia, alojado na antiga Cadeia da Relação na Praça dos Mártires da Pátria. A exposição permanente do espólio de António Pedro Vicente, com uma quantidade e variedade de máquinas e material fotográfico desde a origem da fotografia, é ‘obrigatória’ para os amantes da fotografia. Também para os amantes da literatura do período do romantismo, já que foi nessa antiga prisão que Camilo Castelo Branco terá escrito, em duas semanas!, “Amor de Perdição”. Da sua então cela, a vista é de cortar a respiração, sendo a Sé Catedral o elemento mais proeminente de quem se deixa ficar por instantes que seja, e assim captar um pouco da magia da Sé… do Porto.

A magia pairou através de um casal de meia-idade. Os chapéus que o senhor e a senhora traziam, aliados à elegância com que se moviam, como que flanando por entre as ‘celas fotográficas’, provocavam o nosso grupo, originando uma curiosidade quase generalizada. Não resisti. Sorrindo, elogiei o casal e perguntei se poderia fotografar duas pessoas tão bonitas como elas. Do alto de dez centímetros dos saltos dourados, a senhora de cabelos louros presos sob o chapéu preto anuiu com simpatia. Agradeci. A fotografia é apenas uma das provas de um amor sem perdição, mas em crescendo… Porto, you know I love so!

Este texto foi publicado aqui (sem o AO de 1990), em janeiro de 2018, no âmbito do workshop de escrita de viagens ministrado por Filipe Morato Gomes.

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